DEVEDOR E FISCO FEDERAL PODEM “FAZER NEGÓCIO”

11 de novembro de 2019

Matéria originalmente postada na Revista Rochas, Edição Novembro/Dezembro 2019

Por Guido Pinheiro Côrtes e João Paulo Barbosa Lyra

 

Nem sempre brigar com o Fisco é uma boa solução para empresas que possuem débitos tributários.
A cultura de embate e conflito que sempre existiu entre contribuinte e Fisco, em muitos casos, é desvantajosa para ambas as partes. Isso porque, de um lado, o contribuinte que tem contra si uma enorme dívida, superior à sua real capacidade de pagamento, acaba “morrendo” após muito brigar e gastar; de outro lado, o Fisco também sai perdendo, pois, ao colocar em prática os costumeiros atos de cobrança, termina por inviabilizar a operação da empresa, consequentemente extinguindo a possibilidade de arrecadar o que lhe é devido.
É, portanto, uma guerra inglória, da qual ambas as partes, não raramente, saem sem vitória, sem dinheiro e sem solução: o contribuinte, embora não pague o que deve, continua devendo – o que lhe acarreta dificuldades intransponíveis para dar continuidade à sua atividade econômica; enquanto isso, o Fisco continua com o direito de cobrar, mas sem ter o que arrecadar em pagamento ao seu crédito.
Como uma alternativa mais eficiente e inteligente, surgiu, há pouco tempo, a possibilidade de a Fazenda Pública negociar com os contribuintes devedores a forma de pagamento de suas dívidas tributárias, em moldes parecidos com as negociações privadas.
A permissão advinda do Código de Processo Civil, mais especificamente do seu artigo 190, ensejou inicialmente a publicação de uma primeira Portaria sobre o assunto pela Procuradoria da Fazenda Nacional, na qual se previu tão somente a possibilidade de realização de Negócio Jurídico Processual entre a PGFN e os contribuintes, sem mais detalhes.
A esse ponto, você deve estar se perguntando: o que é, afinal, esse Negócio Jurídico Processual?
Basicamente, é um “acordo” celebrado entre a Fazenda Pública e o contribuinte devedor, com objetivo de criar condições para o efetivo pagamento do crédito tributário, sem que isto venha a representar a decadência ou, até mesmo, a “morte” da empresa. Esse acordo pode prever, por exemplo, o pagamento da dívida através da penhora, mês a mês, de parte do faturamento da empresa, até sua integral quitação.
Deve-se destacar, primeiramente, que no Negócio Jurídico Processual é impossível reduzir quaisquer valores do débito atualizado do contribuinte.
Além disso, é fundamental que se apresente um plano de pagamento da dívida, demonstrando sua viabilidade econômico-financeira, e que o empresário queira de fato resolver o problema da empresa de forma lícita, ética e verdadeira. Isso exclui a possibilidade de realização do Negócio Jurídico Processual, por exemplo, por devedores contumazes, ou os que querem apenas enriquecer na “pessoa física” e deixar a empresa “pobre”.
É claro que, em função do princípio da indisponibilidade do interesse público, uma negociação entre Fazenda Pública e contribuinte é diferente de uma negociação somente entre particulares, sendo necessário observar condições mais rígidas.
À vista disso, preocupada com a dificuldade de estipular os limites do “acordo” com os contribuintes, a Procuradoria da Fazenda Nacional, em recente ato normativo, procurou esmiuçar explicitamente os termos que se admite serem estipulados no acordo.
Após essa regulamentação, a utilização do Negócio Jurídico avança a cada dia, sobretudo em virtude da evidente vantagem econômico-financeira que oferece às partes envolvidas. A Fazenda Pública garante a arrecadação de tributos sem levar as empresas devedoras à falência, dando-lhes a oportunidade de amortizar suas dívidas conforme suas reais condições de pagamento. Por outro lado, o contribuinte também é beneficiado, porque consegue amortizar a dívida com parte de seu faturamento, sem deixar de honrar com os demais compromissos da empresa, o que lhe permite continuar gerando renda e empregos. É uma situação ganha-ganha.
Tudo isso demonstra que o Negócio Jurídico Processual parte de um novo olhar sobre a forma de cobrança e de pagamento das dívidas fiscais. Aquela antiga cultura de Fazenda e contribuinte se enxergarem como inimigos deve ser substituída por uma visão cooperativa.
Com um pouco de sabedoria e bom-senso, chega-se à conclusão de que o Negócio Jurídico Processual é um mecanismo eficiente à disposição das empresas, que favorece a ambas as partes, tornando algo que seria um litígio longo, caro e, muitas vezes, infrutífero, em algo viável e mais proveitoso a todos os envolvidos. A Fazenda conseguindo receber o que lhe cabe e o contribuinte conseguindo gerar receita para pagar sua dívida e continuar sua atividade.
É o novo chegando! É o processo mudando do sentido de litigância para o sentido de cooperação! É uma grande oportunidade para que empresas sérias, que sofreram com períodos de crise econômica, resolverem seus problemas com o “Leão” de forma correta, legal, ética e segura.
Mas não se pode esquecer de que o “remédio cura, porém é amargo”. Ou seja: para a celebração do Negócio Jurídico Processual, há requisitos exigidos pelo Fisco que devem ser objeto de estudo pelo empresário, de forma a verificar a exata possibilidade de seu cumprimento. Nada, porém, que não possa ser alcançado por aqueles que, de fato, quiserem quitar sua dívida e retornar para o caminho do crescimento.

 

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