O Mandado De Segurança em Favor da Suspensão da Exigibilidade de Pagar Tributos: A (In)Capacidade Operacional das Empresas e a Retração do Fluxo de Consumo em Tempos de Pandemia

8 de maio de 2020

O confronto, que tanto a micro como a macroeconomia, têm daqui para frente,  com o desarranjo das relações diante do inimigo desconhecido e letal (novo coronavírus), mostra, em primeiro plano, que a mercantilização da vida, a lógica do capital e o autointeresse, marcas do neoliberalismo, prestigiado pelo atual governo, minguam as alternativas de solução ligadas, apenas e somente, à eficiência e à desregulamentação, ou seja, a intervenção pública volta ao caminho para combate dos vários flancos de desarranjo impostos pelo inimigo. Assim aparecem propostas para encarar a inevitável recessão à base de incentivos e favorecimento das atividades produtivas, incluindo medidas sobre a arrecadação tributária, tomando em conta que, em tempo de calamidade pública, como decretado pelos governos estaduais e municipais, a imposição fiscal há de se adequar a tal excepcionalidade, sob pena de violar a proteção ao confisco, porque o isolamento põe, sobretudo os pequenos e médios empreendedores, em estágio de prostração,  incapazes de responder, a tempo e hora, às demandas contributivas.

Se a pandemia reduz forçosamente a capacidade operacional em decorrência da retração da curva de consumo, o dever fundamental de recolher tributos é comprometido pela redução da capacidade contributiva decorrente da crise de liquidez em função da deficiente circulação monetária trazida pelo ambiente estagnado de negócios. Nesse sentido, a dilatação do prazo para cumprir com as obrigações ao Tesouro tende a gerar fluxo de caixa que funciona como respiradouro para este momento de asfixia e toxicidade empresarial.

A Portaria MF 12/2012 prevê a postergação por três meses das datas de vencimentos das exações administradas pela Receita Federal de todas as pessoas domiciliadas em municípios abrangidos por atos estaduais de reconhecimento de calamidade pública, medida autoaplicável desde sua edição, independente de regramento por ato normativo inferior, apesar da previsão do seu art. 3º, por nela figurarem os itens indispensáveis à fruição do benefício,  bastando a existência de declaração prévia pelo executivo estadual da situação de excepcionalidade, como é o caso estadual do Decreto Legislativo 01/2020.

Decerto que o Ministério da Fazenda, por sua Procuradoria, numa visão atrelada ao dogmatismo tecnicista, que impede o desvelamento dos fenômenos na sua exata dimensionalidade, tem considerado, em distonia com aquilo que verdadeiramente se mostra, que a portaria citada está adstrita a situações como desastres naturais, (desmoronamentos e enchentes), eventos que motivaram, à época, a sua edição.  Ocorre que, com a virada hermenêutica e interpretativa do Direito, os pré-conceitos ignorantes das coisas como verdadeiramente se mostram são refutados com base na verdade captada, prioritariamente, da principiologia constitucional, como condutora primeira do modo de compreensão, ou seja, é preciso buscar a resposta condizente com a Lei Fundamental em toda a sua extensão. Assim, em prol da tese ora defendida, o apoio à livre empresa (art. 170, caput, CF), mandamento básico da ordem econômica e cuja imperatividade condiciona a leitura das regras inferiores, favorece a leitura da portaria fora dos limites advogados pelo órgão fazendário, mesmo porque tal restrição não se coaduna ao âmbito jurídico daquele ato.  

Ainda arrola-se a força maior em favor das empresas (art. 393, CC), que não deram causa, nem exercem atividades relacionadas ao fato gerador do evento danoso, com afastamento da mora do devedor (art. 396, CC), vindo o conjunto de razões dar suporte a mandado de segurança contra o Delegado da Receita Federal em favor da suspensão da exigibilidade dos tributos desde a entrega em vigor do decreto até o último dia útil do terceiro mês subsequente ao das respectivas datas de vencimento originais, sem a incidência de mora, reforçando-se o pleito com a imprevisibilidade do quadro de indefinição científica e consequente incógnita quanto à extensão do atual ambiente restritivo.

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